“É pequenez da Fazenda querer manter o mínimo em R$ 1.302”, diz presidente da CTB

O presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Araújo, concedeu entrevista ao site “Hora do Povo”, nesta segunda-feira (16). No bate-papo, o dirigente falou da expectativa para o encontro com o presidente Lula e reforçou a pauta das centrais, que propõem um salário mínimo de R$ 1.340. “Sabemos pela imprensa que não há acordo ainda entre a Presidência e a Fazenda. Parece-me uma pequenez do Ministério da Fazenda se fixar nos R$ 1.302”, sentenciou.

Confira a íntegra da entrevista:

HP – Bolsa Família, aumento real do salário mínimo, correção da Tabela do Imposto de Renda, dá para levar os três?

Adilson – O aumento real do salário mínimo esquenta a economia e volta para o governo em forma de arrecadação, porque é gasto todo em alimentação. Na pandemia, em 2020, a queda do PIB (soma de tudo produzido no país) só não foi além dos 3,3% devido ao auxílio emergencial de R$ 600, pago a 58 milhões de pessoas, injetando mais de R$ 220 bilhões na economia. A previsão, inclusive do FMI, era uma queda de mais de 10%. Eu digo que salário mínimo e Bolsa Família são poupanças para o governo. A necessidade de se corrigir a Tabela do Imposto de Renda também foi discutida durante toda campanha, visando à garantia de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.

HP – Como a central encara o equilíbrio nas contas do governo?

Adilson – É imperioso que a gente rompa com a lógica liberal. O mercado grita a todo instante quando o governo decide tomar medidas de combate à desigualdade, especialmente em relação à valorização do salário mínimo e ao Bolsa Família. Mas se calam quando do Tesouro torram R$ 800 bilhões no pagamento de juros estratosféricos.

HP – Essa pressão ajuda ou atrapalha o governo?

Adilson – Apoiamos o projeto mudancista do governo do presidente Lula, sem prescindir da autonomia, exatamente para que a gente possa exercer a pressão necessária para que esse ciclo de mudanças possa responder a toda degradação que levou ao esfacelamento da nação. Só vamos recuperar o tempo perdido se atendermos aos anseios e às expectativas de um povo que apostou na possibilidade de um programa de reconstrução nacional. Penso que valorizar em ganho real o salário mínimo é sinalizar para um programa de desenvolvimento nacional com fortalecimento do trabalho.

HP – Mas por que o salário mínimo é tão importante?

Adilson – O salário mínimo tem uma importância fundamental para o processo de valorização do trabalho. Foi uma medida visionária do presidente Vargas, que diante de uma defasagem histórica buscou sacramentar um estado de bem-estar social na esteira das importantes medidas tomadas nas décadas 30 e 40. Teve sua definitiva consagração na Constituição de 1988, em seu artigo 7º, que define os direitos sociais, tendo como elemento substancial a política de valorização do salário mínimo que atendesse à subsistência de um pai, uma mãe e seus filhos. O tamanho do salário mínimo hoje é muito aquém do que foi concebido no seu nascedouro. É singular que a gente siga sustentando e sinalize uma perspectiva de curto prazo que retome o seu real poder de compra. Na maioria das capitais, 70% do salário mínimo é o custo da cesta básica.

HP – Qual o papel que você atribui ao movimento sindical neste momento decisivo que passa o Brasil?

Adilson – Em 7 de abril de 2022, na Conferência das Classes Trabalhadoras (Conclat), construímos uma pauta unificada. O ano 2022 despertou nossa atenção para a construção de novos caminhos, dada sua encruzilhada histórica. Conseguimos barrar a barbárie da ameaça neofascista, embora num quadro de dificuldades. O país foi submetido a uma tecnocracia de plantão para a qual o custo da Constituição não cabe no orçamento da União. Trilharam uma linha de desmonte: desconstitucionaliza-se tudo, desregulamenta-se tudo. Do Tesouro jorram R$ 800 bilhões no pagamento de juros estratosféricos, e uma política de câmbio que destruiu a indústria nacional. Dada a vitória eleitoral, nós inauguramos um novo ciclo e as expectativas são muito grandes. O processo de mudanças vai exigir muito de nossa gente e nada mais singular que unir o povo e a nação. A centralidade da luta política passa pela luta em defesa da democracia, pela retomada do crescimento econômico, pela reindustrialização do país e pela universalização dos serviços públicos.

HP – O que a CTB propõe para os trabalhadores das plataformas digitais?

Adilson – Não é concebível que em pleno século XXI a gente se depare com um tipo de trabalho, via plataforma digital, de qualquer modo que seja, que exija jornadas de trabalho extenuantes, que estão causando morte súbita por trabalho a exaustão. A uberização, formada por um monopólio, se acha no direito de instituir o trabalho análogo à escravidão. À luz do acelerado avanço tecnológico em pleno século XXI, diante das potencialidades da indústria 4.0, inteligência artificial, 5G, o que se espera é um trabalho mais humano, que responda aos pressupostos do trabalho digno, do salário justo, da igualdade e oportunidade, da equidade, saúde e segurança. O trabalho respaldado pelas plataformas digitais precisa de regulamentação, essa gente precisa ser contida. Nós precisamos ter regra para o trabalho remoto. No sentido de humanizar o trabalho: garantia da saúde, do seguro social e dos direitos.

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