Por José Geraldo de Santana Oliveira*
O ano 17, de cada um dos últimos séculos, no Brasil e em muitas outras paragens, tem se mostrado especial, como se fosse iluminado por Cronos — deus do tempo, na mitologia grega —, sendo marcado por acontecimentos sociais que se imortalizam; uns, pelas grandes transformações que provocam; outros, pelo simbolismo, que faz fervilhar os anos que lhe sucedem, gestando o porvir.
Assim o foi em 1817, com a Revolução Pernambucana, que abalou o carcomido domínio colonial e se fez germe da Confederação do Equador de 1824, e das demais vindouras revoltas populares.
Se o ano de 1817 foi, com justa razão, especial, o de 1917, foi muito mais que especial, pois que deu à luz a Constituição Mexicana, de Querétaro, que consagrou direitos fundamentais sociais inapagáveis, como a jornada de oito horas; a Revolução Bolchevique, que representou o alvorecer de ordem social; e a greve geral, em São Paulo, que abriu largos para as grandes mobilizações e conquistas sociais, concretizadas nas décadas posteriores, que ecoam até os dias atuais.
Agora, em 2017, ao se comemorar o centenário desses três vulcões sociais, eis que o Brasil é palco da maior e mais significativa greve geral de sua história, que teve lugar no dia 28 de abril último.
A greve de 2017, que fez tremer os algozes da Ordem Social Democrática, possui, antes de tudo, o magistral significado do reencontro do povo brasileiro com a esperança e com a sua capacidade de fazer a história; não a desenhada pelo consórcio do mal, formado pela Presidência da República, o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF), todos a serviço do capital, contra a cidadania; mas sim, aquela profetizada pelo saudoso presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Ulisses Guimarães, que tem cheiro de amanhã e não de mofo.
A greve geral do dia 28, já inscrita na eternidade histórica, reveste-se, também, de enorme valor social e político, pelos milhões de brasileiros e brasileiras que a ela acorreram.
Faz-se necessário registrar que, nas centenas de cidades brasileiras onde a greve geral disse presente, os que não aderiram, com a presença física (de corpo), às passeatas e mobilizações, que se espalharam pelas principais avenidas, fizeram-no com pensamentos, palavras e gestos, ou seja, metaforicamente falando, aderiram de alma.
Ao contrário de passeatas recentes, quando os olhares eram de indiferença e/ou de reprovação, não faltando apupos, os de agora foram todos de respeito e aquiescência.
Parafraseando o grande cantor e revolucionário português Zeca Afonso, em sua música, que se tornou o hino e a senha da Revolução dos Cravos, de 1974, “Grândola Vila Morena”; os que tivemos o privilégio de ser partícipes da greve geral de 2017 constatamos que, em cada esquina, havia centenas de amigos, e, em cada rosto, igualdade. Que dia inesquecível.
Por certo, a greve geral de 28 de abril de 2017, por si só, não será bastante para depor o já citado consórcio do mal. Mas, com certeza, plantou a semente de novas grandes mobilizações, com muito mais presença de corpo e de alma.
Essa greve foi especial em tudo, trazendo como fato novo e alvissareiro o explícito, expresso e atuante apoio, para além de todas as centrais sindicais, de entidades e entes que se constituem em esteio da Ordem Democrática, como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas (Anamatra), a Associação dos Procuradores do Ministério Público do Trabalho (ANPMPT), o Procurador-Geral do Ministério Público do Trabalho.
Isto, para os amantes e cultores da cidadania, é digno de louvor e regozijos; e, para os detratores desta, de pavor e de desespero. Aliás, já expressados nas desavergonhadas falas de Temer — o impostor —, do ministro da (In)Justiça, Osmar Serraglio, e do ventríloquo de tirano, João Dória.
Ah! O povo brasileiro, no dia 28 de abril de 2017, fez ecoar o brado do imortal revolucionário poeta Castro Alves, em seu magnifico poema “O Povo ao poder” — que é a sua declaração de amor ao porvir radioso —, na seguinte estrofe:
”Pois bem! Nós que caminhamos
Do futuro para a luz,
Nós que o Calvário escalamos
Levando nos ombros a cruz,
Que do presente no escuro
Só temos fé no futuro,
Como alvorada do bem,
Como Laocoonte esmagado
Morreremos coroado
Erguendo os olhos além”.
Destarte, os que fomos partícipes do imortal dia 28 de abril de 2017, devemos fazer nossa a epopeia do herói do poema “I-Juca Pirama”, de Gonçalves Dias, assim exarada:
“Assim o Timbira, coberto de glória,
Guardava a memória
Do moço guerreiro, do velho Tupi.
E à noite nas tabas, se alguém duvidava
Do que ele contava,
Tornava prudente: “Meninos, eu vi!”.
Podemos e devemos dizer aos que não puderam ou não quiseram participar desse dia ímpar, bem como às futuras gerações: Meninos, nós vimos! Nós estávamos lá!
*José Geraldo de Santana Oliveira é consultor jurídico da Contee